
AAP Língua Portuguesa 2019 - 3ª série EM
Avaliação da Aprendizagem em Processo
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![Leia os textos e responda às questões 01, 02 e 03.
Texto II
A BAGACEIRA
Era o êxodo1 da seca de 1898. Uma ressurreição de cemitérios antigos – esqueletos redivivos2, com o aspecto terroso e o fedor das covas podres.
Os fantasmas estropiados3 como que iam dançando, de tão trôpegos e trêmulos, num passo arrastado de quem leva as pernas, em vez de ser levado por elas.
Andavam devagar, olhando para trás, como quem quer voltar. Não tinham pressa em chegar, porque não sabiam aonde iam. Expulsos de seu paraíso por espadas de fogo, iam, ao acaso, em descaminhos, no arrastão dos maus fados4. Fugiam do sol e o sol guiava-os nesse forçado
nomadismo5. Adelgaçados6 na magreira cômica, cresciam, como se o vento os levantasse. E os braços afinados desciam-lhes aos joelhos, de mãos abanando. Vinham escoteiros7. Menos os hidrópicos8 – doentes da alimentação tóxica – com os fardos das barrigas alarmantes. Não tinha sexo, nem idade, nem condição nenhuma. Eram os retirantes. Nada mais. Meninotas, com as pregas da súbita velhice, careteavam, torcendo as carinhas decrépitas9 de ex-voto10. Os vaqueiros másculos, como titãs alquebrados, em petição de miséria. Pequenos fazendeiros, no arremesso igualitário, baralhavam-se nesse anônimo aniquilamento. Mais mortos do que vivos. Vivos, vivíssimos só no olhar. Pupilas do sol da seca. Uns olhos espasmódicos de pânico, como se estivessem assombrados de si próprios. Agônica11 concentração de vitalidade faiscante.
Fariscavam12 o cheiro enjoativo do melado que lhes exacerbava os estômagos jejunos. E, em vez de comerem, eram comidos pela própria fome numa autofagia13 erosiva. [...]
A cabroeira14 escarninha15 metia-os à bulha16:
– Vem tirar a barriga da miséria.
Párias da bagaceira17, vítimas de uma emperrada organização do trabalho e de uma dependência que os desumanizava, eram os mais insensíveis ao martírio das retiradas.
A colisão dos meios pronunciava-se no contato das migrações periódicas. Os sertanejos eram mal vistos nos brejos. E o nome de brejeiro cruelmente pejorativo.
[...] Essa diversidade criava grupos sociais que acarretavam os conflitos de sentimentos.
Estrugia18 a trova repulsiva:
Eu não vou na sua casa,
Você não venha na minha,
Porque tem a boca grande,
Vem comer minha farinha...
Homens do sertão, obcecados na mentalidade das reações cruentas, não convocavam as derradeiras energias num arranque selvagem. A história das secas era uma história de passividades. Limitavam-se a fitar os olhos terríveis nos seus ofensores.
[...] Dagoberto olhava por olhar, indiferente a essa tragédia viva. A seca representava a valorização da safra. Os senhores de engenho, de uma avidez vã, refaziam-se da depreciação dos tempos normais à custa da desgraça periódica. [...]
Questão 01
Com relação à temática apresentada, os Textos I e II](/_image?href=https%3A%2F%2Fimg.quizur.com%2Ff%2Fimg5dd2dda03480b4.66477411.jpg%3FlastEdited%3D1574100434&w=400&h=400&f=webp)
Leia os textos e responda às questões 01, 02 e 03. Texto II A BAGACEIRA Era o êxodo1 da seca de 1898. Uma ressurreição de cemitérios antigos – esqueletos redivivos2, com o aspecto terroso e o fedor das covas podres. Os fantasmas estropiados3 como que iam dançando, de tão trôpegos e trêmulos, num passo arrastado de quem leva as pernas, em vez de ser levado por elas. Andavam devagar, olhando para trás, como quem quer voltar. Não tinham pressa em chegar, porque não sabiam aonde iam. Expulsos de seu paraíso por espadas de fogo, iam, ao acaso, em descaminhos, no arrastão dos maus fados4. Fugiam do sol e o sol guiava-os nesse forçado nomadismo5. Adelgaçados6 na magreira cômica, cresciam, como se o vento os levantasse. E os braços afinados desciam-lhes aos joelhos, de mãos abanando. Vinham escoteiros7. Menos os hidrópicos8 – doentes da alimentação tóxica – com os fardos das barrigas alarmantes. Não tinha sexo, nem idade, nem condição nenhuma. Eram os retirantes. Nada mais. Meninotas, com as pregas da súbita velhice, careteavam, torcendo as carinhas decrépitas9 de ex-voto10. Os vaqueiros másculos, como titãs alquebrados, em petição de miséria. Pequenos fazendeiros, no arremesso igualitário, baralhavam-se nesse anônimo aniquilamento. Mais mortos do que vivos. Vivos, vivíssimos só no olhar. Pupilas do sol da seca. Uns olhos espasmódicos de pânico, como se estivessem assombrados de si próprios. Agônica11 concentração de vitalidade faiscante. Fariscavam12 o cheiro enjoativo do melado que lhes exacerbava os estômagos jejunos. E, em vez de comerem, eram comidos pela própria fome numa autofagia13 erosiva. [...] A cabroeira14 escarninha15 metia-os à bulha16: – Vem tirar a barriga da miséria. Párias da bagaceira17, vítimas de uma emperrada organização do trabalho e de uma dependência que os desumanizava, eram os mais insensíveis ao martírio das retiradas. A colisão dos meios pronunciava-se no contato das migrações periódicas. Os sertanejos eram mal vistos nos brejos. E o nome de brejeiro cruelmente pejorativo. [...] Essa diversidade criava grupos sociais que acarretavam os conflitos de sentimentos. Estrugia18 a trova repulsiva: Eu não vou na sua casa, Você não venha na minha, Porque tem a boca grande, Vem comer minha farinha... Homens do sertão, obcecados na mentalidade das reações cruentas, não convocavam as derradeiras energias num arranque selvagem. A história das secas era uma história de passividades. Limitavam-se a fitar os olhos terríveis nos seus ofensores. [...] Dagoberto olhava por olhar, indiferente a essa tragédia viva. A seca representava a valorização da safra. Os senhores de engenho, de uma avidez vã, refaziam-se da depreciação dos tempos normais à custa da desgraça periódica. [...] Questão 01 Com relação à temática apresentada, os Textos I e II
abordam temas relativos ao sentimento nordestino: no quadro, percebe-se o sofrimento; no trecho do romance, o humor.
fazem referência ao mesmo tema, ambos descrevem a trajetória dos retirantes por meio da perspectiva dos senhores de engenho.
contradizem o tema, pois o quadro é composto por tons terrosos e de cinza, enquanto o trecho do romance enfatiza a avidez dos senhores de engenho.
fazem uma representação realista da vida ao abordar um grave problema social, traduzindo os males e as angústias dos retirantes nordestinos.
diferem quanto ao tema: no quadro, temos representadas as mazelas e o sofrimento; no trecho do romance, percebemos a exaltação dos retirantes.
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Questão 02 A pintura de Portinari pode ser associada ao romance “A Bagaceira” pelo seguinte trecho
“Os fantasmas estropiados como que iam dançando, de tão trôpegos e trêmulos, num passo arrastado de quem leva as pernas, em vez de ser levado por elas [...]”
“Os fantasmas estropiados como que iam dançando, de tão trôpegos e trêmulos, num passo arrastado de quem leva as pernas, em vez de ser levado por elas [...]”
“A seca representava a valorização da safra. Os senhores de engenho, de uma avidez vã […]”.